O que fazer com a indisciplina?
Indisciplina, multiculturalidade e inclusão são temas que preocupam educadores no mundo todo. No mês de julho deste ano, tive o prazer de dialogar com professores municipais na sede do CMP sobre esses temas e fiquei muito feliz ao saber que estratégias efetivas vem sendo adotadas também em Passo Fundo, RS. Menciono esse aspecto porque fui professora da referida rede até 2007, quando tive a oportunidade de vir trabalhar nos EUA, também como professora.
Durante os últimos dez anos, tenho conduzido reflexões comparativas sobre educação entre as Américas e esses temas tão importantes tanto no Brasil como nos EUA. Nesse artigo vou abordar a indisciplina. A definição de indisciplina pode ser teoricamente complexa ou reduzida “a ausência de disciplina”, sendo assim, pode ser simplificada a “desobediência ao conjunto de regras de conduta impostas aos membros de uma coletividade”.
A indisciplina pode ser passiva ou ativa. Na manifestação passiva, os estudantes podem se recusar a participar de projetos, esperar o adulto que fiscaliza as regras estar ausente para ventilar suas idéias, cochichar, não copiar a matéria, entre outras formas menores. Já, na manifestação ativa da indisciplina, existe confronto entre pessoas, questionamento das regras e desentendimento com o adulto responsável pelas mesmas, os exemplos mais comuns são discussões com colegas e professores, agressividade verbal e física, chegando ao ponto de interromper a aula.
No meu tempo como educadora brasileira há mais de dez anos atrás, relembro episódios frequentes de indisciplina ativa na minha sala e na sala de meus colegas, vamos dizer, a bagunça, as brigas, os bate-bocas. No meu trabalho com estudantes nos EUA, não encontrei indisciplina ativa, mas sim passiva. As regras e o sistema norte-americano são tão firmes que os estudantes não expressam sua indisciplina. Sendo assim, também não expressam sua afetividade. Jamais presenciei uma bagunça, um bate-boca ou uma briga em sala de aula.
Isso não quer dizer que indisciplina ativa não exista aqui, mas ela é mais rara porque existem consequências pesadas e imediatas aos que quebram as regras, como expulsão, reprovação e até mesmo constrangimento público. Uma sala de aula em que não há reclamações, uma maravilha, certo? Na verdade, essa supressão dos sentimentos, falta de afetividade e expressividade gera outros problemas. A preocupação aqui é com atiradores em massa. Estudantes que, ano após ano, reprimiram seus sentimentos, seguiram as regras e derepente explodem e perdem conexão com a realidade, pegam uma arma, matam seus colegas e professores e se matam. Esses episódios são tão frequentes nos EUA que preparação para enfrentar atiradores em massa, faz parte da formação de professores.
Qual a alternativa para a indisciplina então? Nas minhas palestras agrupo os modelos educativos nas seguintes categorias: afetiva e criativa – Brasil, competitiva e eficiente – EUA e educação integral – Europa. Tanto o modelo brasileiro como o americano apresentam seus prós e contras. Uma educação baseada na afetividade estimula a criatividade e a segurança dos estudantes, mas talvez crie dificuldades para controlar o andamento de certas atividades. Aqui meus colegas freireanos e montessorianos vão se apoiar na idéia que o controle não é necessário, que se deve ter autoridade sem ser autoritário, etc. Essa discussão vou deixar para um outro momento.
Uma educação regrada e competitiva, como nos EUA, contribui para o desenvolvimento do futuro profissional e da sociedade como um todo, mas ignora o desenvolvimento pessoal. Assim sendo, gera depressão, mata a criatividade e é capaz de gerar traumas profundos. Já, a educação integral seria o modelo que creio ser mais adequado para o sucesso escolar. Na educação integral faz-se o mapa da indisciplina, incluindo diagnóstico, causas e estratégias, bem como trabalhando a disciplina (e não a indisciplina) em si mesma.
Nesse sentido, envolver os estudantes na construção, implementação e avaliação das regras de convivência torna-se um dos métodos mais efetivos para reduzir as manifestações de indisciplina. Alguns professores da rede municipal de Passo Fundo sabiamente já colocam essa idéia em prática desde o primeiro dia de aula. Quando surge algum problema com quebras de regras, uma estratégia seria formar um comitê para decidir ou julgar o caso, esse comitê inclui a participação dos próprios estudantes para decidir o que fazer com o estudante que quebrou a regra.
Nesse artigo, quero aproveitar e deixar algumas estratégias práticas que já utilizei para contornar ou amenizar problemas com disciplina. Tais sugestões seriam evitar as seguintes condutas enquanto educador: parar o grupo sempre que não obtêm êxito; usar termos negativos para respostas ou longas explanações; pensar que o problema é pessoal e os educandos estão contra você; presumir que existe somente um caminho para se chegar ao resultado final e; subestimar a capacidade dos alunos.
Como proceder na indisciplina ativa? Inicialmente avalie a situação mentalmente, depois revise valores e o impacto no grande grupo, mas acima de tudo é importante que essa situação não seja ignorada, ampliada ou que sirva de influência para os demais alunos; escute e perceba as limitações ou potencialidades, seja empático, flexível e converse individualmente com cada integrante do grupo, cuidando para que não se sintam humilhados ou excluídos; e organize trabalhos em grupos colocando estudantes com diferentes habilidades para compartilhar as tarefas.
Essas sugestões não eliminarão futuros problemas com indisciplina, portanto focar nas regras de convivência com a participação dos alunos e criar um mapa de indisciplina junto com outros colegas e gestores pode ajudar a prevenir e eliminar as causas da indisciplina ativa. Acima de tudo, a afetividade da educação brasileira deve ser mantida e fortalecida sempre que possível pois, educar exigem coragem e amor. Parabéns colegas educadores da rede municipal de Passo Fundo-RS.