Rumos da educação: candidatos falam sobre Escola Sem Partido

Parceria entre FAED e CMP Sindicato ouviu candidatos à Assembleia Legislativa

Na noite da última segunda-feira (18) os candidatos a deputado estadual pelo Rio Grande do Sul, vinculados ao município de Passo Fundo Airton Lângaro Dipp (PDT), Cacá Nedel (Podemos), Eduardo Peliciolli (Podemos), José Carlos Carles de Souza (PSD), Juliano Roso (PCdoB) e Mari dos Santos (PT) expuseram suas perspectivas sobre “Os rumos da educação no Rio Grande do Sul: realidades, perspectivas e projetos”.

O evento promovido pela Faculdade de Educação (Faed) e pelo Sindicato dos Professores Municipais de Passo Fundo (CMP Sindicato) reuniu estudantes de diversos cursos da universidade e comunidade em geral. A atividade foi realizada em três momentos e a ordem dos candidatos para abordar os temas foi definida por sorteio.

Confira as respostas dos candidatos no segundo bloco:

Escola Sem Partido- Qual a compreensão mais pertinente desse fenômeno?

Juliano Roso (PCdoB)

“Estamos vivendo um momento de grande conservadorismo na educação brasileira e esse projeto “Escola Sem Partido” tem um nome muito sedutor, porque ninguém quer um partido político na sua escola, ele representa o suprassumo deste conservadorismo. O magistério hoje te imensos desafios pela frente, dificuldades imensas e absurdas. E alguns iluminados, liderados pelo novo pedagogo brasileiro Alexandre Frota, entendem que a saída para os problemas da educação é este projeto.

E mais, vamos mais além, apresentam a volta da Educação Moral e Cívica porque são saudosistas e filhotes da Ditadura Militar, apresentam projetos como a obrigatoriedade de ensino da teoria do criacionismo em escolas públicas e privadas no Rio Grande do Sul, confundem o ambiente público com ambientes da sua religião. A República já resolveu isso em 15 de novembro, quando separou o estado da igreja, uma grande confusão que eles criam e que confunde a população, sobretudo, com elas.

Mas isso que parecia uma piada, uma brincadeira, já foi aprovado em muitos estados. […] EU quero trazer para vocês um parecer do Ministério Público Federal acerca dos projetos Escola Sem Partido: ‘O projeto de lei Escola Sem Partido subverte a atual ordem constitucional por inúmeras razões, portanto confunde a educação escolar com aquela que é fornecida pelos pais e com isso espaço público, com espaço privado. Impede o pluralismo de ideias e concepções pedagógicas, nega a liberdade de cátedra e a possibilidade ampla de aprendizagem, contraria o princípio da laicidade do estado, porque permite no âmbito da escola (espaço público na concepção constitucional) a prevalência de visões morais, éticas e religiosas particulares.

O Projeto Escola Sem Partido está na contramão dos objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil especialmente nos de “construir uma sociedade livre, justa e solidária, e promover o bem todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Isso está na Constituição Federal, na LDB.

O STF quando julgou, ainda em caráter liminar, uma ação movida pelo Sindicato dos Professores da Rede Privada de Ensino de Alagoas contra essa proposta aprovada determinou, em uma ação liminar expedida pelo Ministro Barroso que “quanto maior o contato do aluno com visões de mundo diferentes, mais amplo tende a ser o universo de ideias a partir do qual pode desenvolver visão crítica e mais confortável tende a ser o trânsito em ambientes diferentes dos seus. É por isso que o pluralismo ideológico e a promoção dos valores da liberdade são assegurados na Constituição e em todas as normas internacionais”.

Nenhuma destas normas menciona neutralidade, portanto não existe neutralidade. Os caras querem neutralidade, nem o sabão é neutro quem dirá a educação ser neutra. A própria concepção de neutralidade é altamente questionável tanto no ponto de vista humano quanto na educação. Nenhum professor é uma folha em branco, a própria concepção de Escola Sem Partido parte de preferências políticas e ideológicas. Essa turma do Escola Sem Partido o que mais tem por trás, é um partido político.

Por isso eu fui o primeiro parlamentar do Brasil a apresentar um projeto como o Escola Sem Mordaça, que busca garantir o que está escrito na LDB e na Constituição e que seja cumprido”.

 

Cacá Nedel (Podemos)

“Esse é um projeto extremamente enxuto pra gente ler, com somente três artigos mas que traz como pano de fundo essa onda conservadora e fascista que o Brasil vem vivendo há cada dia. N momento que se diz que não se pode discutir na escola o diferente do que os pais discutem em casa, então a escola não faz mais sentido.

Uma das coisas que mais me chama a atenção é quando o projeto do Escola Sem Partido veta a transversalidade na educação. Os presentes sabem que um dos principais recursos que a gente tem na metodologia da didática, é justamente a transversalidade e isso faz com que o conhecimento se dê de uma forma mais efetiva.

É um projeto que se diz para melhorar a educação e veta o princípio da transversalidade sendo, no mínimo, incoerente e contraditório. A questão de o estado ser laico deve ser defendida sempre e a educação tem este papel. […]

Questões como a não discussão de educação sexual, por exemplo, que é uma questão de saúde pública e me traz o questionamento de até quando nós teremos meninas, adolescentes, engravidando se isso não for debatido na escola, já que na maioria das vezes também não é debatido em casa.

Eu sou totalmente contra esse projeto. Como educador eu vejo que ele não faz sentido algum e que na verdade se trata, de fato, de uma mordaça já que existe a pecha de que os educadores trabalham com a doutrinação marxista. Então na verdade é escola sem partido, mas qual partido? O meu, o teu… Porque no momento que tu diz que não pode falar de determinado assunto e quem tem que falar é o outro, de outra forma, cadê a neutralidade?”

 

Mari dos Santos (PT)

“É importante que a gente diga, principalmente neste momento que se coloca como candidato, que somos contra o projeto Escola Sem Partido. É importante ter posição e assumir essa posição não só aqui neste momento, mas que depois possam seguir defendendo isso na Assembleia Legislativa.

Uma coisa que me chama atenção na questão Escola Sem Partido, discussão eu já vem de algum tempo, é que é um projeto inconstitucional. A Procuradoria Geral da União tem parecer sobre esse projeto falando da sua inconstitucionalidade. No entanto, em alguns lugares, esse projeto já foi aprovado e hoje já está sendo discutido na Câmara Federal e no próprio Senado para ver como isso vai se dar, já que está tomando proporções de na maioria das cidades projetos como esse sejam apresentados.

Eu observo que o projeto despreza a intelectualidade, a capacidade do estudante absorver e aprender o conteúdo que lhe é passado. Com o Escola Sem Partido é como se o professor não pudesse falar sobre determinado assunto porque o seu aluno não terá condição de discernimento daquilo que está sendo passado pelo educador. Como se o estudante fosse algo que tudo que for passado pelo professor ele tem que absorver e levar como verdade.

Além de restringir a liberdade de expressão vai contra os princípios da educação. ‘Meus filhos, minhas regras’ o Escola Sem Partido é mais ou menos isso: “o que eu penso para o meu filho eu quero que escola pública também trabalhe neste sentido”.

Quer dizer, se eu sou católica meu filho não pode ouvir falar de outra religião. Sem falar na questão de gênero, que eles erroneamente chamam de ‘ideologia de gênero’ para chamar a atenção da sociedade pra dizer que a educação, que o ensino, está levando a nossa juventude, o estudante, a tendências até homossexuais, pelo fato de ser discutido gênero em sala de aula.

É um absurdo isso! Porque se nós não podemos conversar, dialogar, na sala de aula aonde dentro deste espaço temos várias vozes, um setor onde temos a pluralidade.  A pluralidade e a fala não são somente do professor, mas também do aluno. Portanto é importante que possamos fazer as discussões em sala de aula de tudo que é necessário e relevante pra sociedade”.

 

Eduardo Peliciolli (Podemos)

“Quando se fala em Escola Sem Partido é porque basicamente um grupo de políticos mais conservadores diz que é proibido trazer algumas pautas para as escolas então, na cabeça deles, essas pautas são de determinados partidos e se elas são determinados partidos elas não podem ser discutidas na escola.

Então quando se fala o combate da violência, o combate da homofobia, quando se fala em estado laico, quando se fala em valorização da educação, em qualidade de ensino, estamos falando de forma que talvez um grupo político é partidário. Isso não é partidário, isso são pautas da sociedade.

Por muito tempo atuei no movimento estudantil e hoje sou acadêmico do curso de direito e no dia-a-dia do movimento estudantil essas são nossas pautas de luta. Um país mais igual, um país menos violento, em que o professor não precise se preocupar com tantos problemas de infraestrutura e que ele possa realmente passar o seu conteúdo pedagógico, mas também desenvolver uma reflexão.

O que o professor faz quando traz ao seus alunos esses temas é uma reflexão sobre a nossa sociedade. E isso não é partidariza-los, é mostrar aonde nós vivemos, no Brasil, que tem estes problemas. Quando eu fiz a discussão, que foi muito difícil pelo momento conservador que vivemos no Brasil e no qual estamos há um bom tempo, eu fui autor da Lei de Combate à Homofobia em Passo Fundo, que criou um dia e uma semana para discussão e ações afirmativas para se discutir a diversidade e a violência que estava acontecendo com os grupos da cidade que defendiam a causa LGBT.

E nós percebemos o quanto era difícil para os professores levarem este tema para a sala de aula. Inclusive tem alguns professores que também vestem essa camiseta e quando nós vamos falar na escola ou diretamente nos professores, muitos dizem que não querem.

Mas como o senhor, professor, que tem que estudar os candidatos, linear essa reflexão com os alunos, o senhor sempre tem que discutir política! É através da política que nós vamos mudar o Brasil. É através da política que nós vamos mudar a educação e esse é o caminho correto.

Então com certeza, Escola Sem Partido não serve para ninguém. E nem mesmo para aqueles que hoje estão defendendo que a Escola Sem Partido é o caminho. Se eles conseguirem trazer de volta Moral e Cívica e indicar que o estado é cristão, ignorando as outras religiões, nós vamos para um caminho que é muito difícil de voltar.

Nós temos aqui em Passo Fundo um candidato que chama professor de vagabundo, que protocola projeto pedindo EMOCI, que discute na Câmara de Vereadores um retrocesso no Plano Municipal de Educação porque lá algumas linhas falam sobre respeito à diversidade, mas ele não olha que o Plano não avançou em nenhuma meta. A preocupação dele é com a discussão da diversidade sexual”.

 

José Carlos Carles de Souza (PSD)

“O tema sem dúvida tem uma complexidade por tudo aquilo que ele revela, mas evidentemente não podemos concordar com a posição de que a escola seja vedada de discutir determinados temas. A escola é um espaço plural, deve abordar todos os temas. É um espaço democrático, sobretudo de respeito. E quando falo de respeito, é respeito do professor para com seu aluno, do aluno com seu professor, e ambos com a sociedade.

O que não se pode de forma alguma admitir é o professor, que tem o direito de cátedra assegurado, possa fazer em sua sala de aula espaço para pregação das suas convicções pessoais. Ele pode fazer isso sim, desde que apresente as diversas versões do tema abordado. Se vai falar sobre religião, que fale sobre as religiões. Vai falar sobre questões de gênero, pois bem, aborde o tema da forma que ele tem que ser abordado. Vai falar de política, talvez o tema mais sensível, deve ser abordado sem nenhuma paixão partidária. Ele pode até dizer o seu partido, sem nenhum partido, é direito dele se manifestar.

O que não pode é fazer uma pregação de que o seu partido está correto, está certo, e os outros estão todos errados. Apresente os argumentos e deixe aos alunos fazerem essa reflexão. É assim que nós vamos criar uma sociedade emancipada. É oportunizando o espaço democrático da escola, é fortalecendo o diálogo próprio que deve haver na escola que nós vamos nos construir.

Se não for deste modo estaremos diante de uma imposição, quem sabe de um projeto pedagógico que aquela escola adota quando deveria adotar um projeto mínimo padrão, mas não apenas o padrão, ele deve ser muito maior. Eu falo mínimo padrão naquelas disciplinas que são obrigatórias, que o aluno precisa ter formação e tantas outras que também poderão ser pauta para o debate dentro da escola.

Não há limites para isso. Professor pode instigar os alunos a fazer o debate, mas um debate altruísta, um debate que seja muito consequente naquilo que se propõe. Como é que ele vai fechar este assunto, por exemplo, na questão de gênero quando se percebe que tem tantas e tantas manifestações equivocadas. A está certo, B está certo, C está certo…

De quem é essa verdade? O que nós precisamos é que a escola possa ser um espaço de formação na sua maior amplitude, sem delimitar pontos de interesse de apenas uma pessoa. Tem que ser plural”.

 

Airton Lângaro Dipp (PDT)

“Nós entendemos que o ambiente de uma escola tem que ser o mais criativo possível, aonde todos possam participar, todos possam ter as suas ideias, suas convicções e somente através da discussão é que há o avanço, de fato, educacional.

Escola Sem Partido é uma piada! É melhor fechar a escola do que criar uma Escola Sem Partido, porque nós estaremos limitando não os professores, mas as crianças, jovens e adolescentes que precisam de fato discutir sobre as mais diferentes questões e precisam buscar, através do conhecimento, através da observação, através das suas convicções, os caminhos adequados ao seu crescimento pessoal.

A Escola Sem Partido é piada! Eu vou aproveitar meu tempo e vou voltar, para concluir a primeira parte que tratava da educação com qualidade. O principal são recursos para a educação. E falo de duas áreas que precisam de recursos carimbados. Recurso carimbado não é aquele orçamento livre, é um orçamento vinculado para educação e saúde. Sem recursos não se chega a nada: nem estrutura física, nem valorização dos professores e muito menos avanços tecnológicos.

Na Assembleia Legislativa nós estamos apoiando e vamos lutar para que pelo menos 50% das empresas públicas gaúchas, especialmente o Banrisul, possam destinar o seu lucro ou o dividendo conforme empresa pública para a educação. Quanto mais recursos vinculados para a educação, nós poderemos avançar muito mais para um ensino de qualidade. Isso nós vamos defender.

Outra questão importante, falando sobre a legislação, é que na realidade políticas de estado precisam ser observadas muito mais profundamente. Vou dar um exemplo: em 89 iniciou-se no país a questão do Ensino Integral, e as escolas municipais em tempo integral tiveram origem com o PDT no país, Passo Fundo avançou muito em escolas de turno integral. Quatro anos depois, e é uma culpa minha não ter transformado em política de estado, do município de fato e não só de governo, todas aquelas escolas foram sendo fechadas e voltadas ao ensino tradicional. Isso é muito ruim! Presidente Fernando Henrique Cardoso, passando par ao ensino superior, durante os oito anos baixou um decreto administrativo proibindo a ampliação das universidades públicas do país. Proibiu a ampliação das escolas técnicas do país, uma contradição incrível!

Finalmente no governo que se sucedeu isso foi revogado e o país avançou muito no ensino público universitário e nos institutos federais. Estou frisando muito bem a questão de política de estado e recursos vinculados para a educação. Parece uma questão simples, mas não é.  Quanto mais tu vincular no orçamento do estado, da União, dos municípios, nessas duas áreas os avanços serão significativos.”

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