EMEI Francisco Luiz Biancini

Afetividade como ferramenta pedagógica

Criada através de um decreto do prefeito Doutor Firmino da Silva Duro, no ano de 1982, a Creche Municipal do Projeto Habitacional Passo Fundo Tchê, núcleo Jabuticabal, funcionou em uma casa alugada até meados dos anos 2000 e hoje atente em imóvel próprio do município, atendendo cerca de 240 crianças provenientes não só do bairro em que se localiza, mas também dos arredores.

Hoje denominada Escola Municipal de Educação Infantil Francisco Bianchini, o educandário recebeu a visita do Jornal Educação e Debate neste primeiro semestre de 2019. Atualmente, a escola conta com uma área ampla, que poderia ser ainda melhor e mais adequada para a sua demanda, mas a realidade dessa comunidade já foi de espaço físico ainda mais limitado.

O nome da escola foi escolhido para homenagear o alto espírito comunitário e o elevado conceito no contexto social do município com que se houve através do senhor Francisco Luiz Biancini. A EMEI conta com Berçário, Maternal I, Maternal II, Pré I e Pré II, que são atendidos por uma equipe de 15 professores, mais diretora e coordenadora, cinco assistentes, dois monitores, duas cozinheiras e duas serventes.  A atual diretora já foi coordenadora da escola por alguns anos e não só conhece a comunidade, como se sente parte dela.

No ano de 2019, assume a direção a professora Diomara Rúbia Ractz, que atua na rede municipal desde 2012; no ano passado, ocupava o cargo de coordenadora pedagógica da escola. Perla Rubiara Ribas, que já foi diretora da escola e trabalha na rede desde 2007, assume agora como coordenadora. Juntas, buscam continuar o trabalho iniciado aprimorando-o a cada dia.

Orgulhosas, lembram que a escola já teve tempos difíceis; hoje, apesar dos desafios diários, a escola vive seu melhor momento. A lista de espera que começa o ano zerada e vai aumentando com o passar dos meses, principalmente na etapa Creche, é prova do reconhecimento do trabalho feito nos últimos anos.

“Quando a gente chegou, não tinha a parte nova da escola, ainda estava em obras. Teve a inauguração e a gente conquistou bastante coisa depois da conclusão da escola. É algo cru, que foi se trabalhando, equipando, organizando. Não tinha nem pracinha,” contam. Perla lembra que, quando começou, a escola tinha somente quatro salas de aula. Com a ampliação do espaço físico, também foi possível aumentar a quantidade de alunos.

Dentre as preocupações da equipe desta EMEI, está a busca pelo envolvimento das famílias nas atividades da escola. Assim como todas as EMEIs, a Francisco Luiz Biancini enfrenta o desafio de construir, junto à comunidade, o esclarecimento da escola como lugar de aprendizado, e não necessariamente de cuidado. A escola teve, por muitos anos, o caráter assistencialista; diante disso, foi necessário um tempo para que a comunidade passasse a ver a EMEI como escola.

“Nosso maior desafio foi mostrar para a comunidade que somos escola. A comunidade já vai entendendo que a escola é um direito da criança e não dos pais. A gente não tinha nada aqui, era só campo, não tinha brinquedos, não tinha nada! Claro que ainda estamos longe do que gostaríamos de oferecer para a comunidade, mas lutamos para oferecer o que está ao nosso alcance e o reconhecimento deste trabalho se deu através do resultado das eleições”, comemoram.

 

Segunda casa

O sucesso da EMEI Francisco Biancini ao atendimento de centenas de crianças não seria possível sem o empenho dos cinco assistentes que compõem a equipe: Macheli de Lima, Fabiana Soares Cruz, Lilian Sitta Moreira, Ana Maria Batista e Elisângela Makeli Maciel Cruz.

Maicheli e Aline, que estão há mais tempo na comunidade, já acompanham o crescimento dos seus alunos através dos níveis. Dizem se sentir gratos pela construção que o seu trabalho traz à comunidade local e destacam que desafios e barreiras são encontrados em qualquer profissão.

“Temos uma boa parceria com a comunidade! A gente sempre chora na formatura, cria laços com essas crianças que, muitas vezes, passam mais tempo conosco do que com os próprios pais, que ficam longe em virtude do trabalho. Ao cumprir o cargo da gente, nós passamos mais tempo com as nossas crianças (como chama carinhosamente os alunos) do que com as nossas famílias,” confessam os assistentes emocionados.

Em virtude do deslocamento de suas casas até a EMEI, contam que acabam ficando direto na escola, passando mais tempo lá do que nas suas próprias casas. Destacam o empenho da direção da escola em acolher os assistentes e possibilitar o melhor cenário para que eles desempenhem suas atividades.

Quando questionados sobre os desafios, desabafam que sentem a desvalorização da profissão por parte da Administração Municipal. “A visão que se tem do assistente ainda é distante dos profissionais da educação, quando na prática a realidade é outra, com assistentes, muitas vezes, tendo a responsabilidade de assumir salas de aula. O trabalho do assistente, na prática, passa da nomenclatura. Esse é um problema de toda a rede”, destacam.

Sobre o novo ciclo sob a direção de Diomara, os assistentes comemoram o trabalho realizado até agora e esperam que se dê continuidade ao processo que vinha sendo desenvolvido e já mostra seus resultados.

 

Afetividade como ferramenta pedagógica

A escola prioriza o brincar, o aprender brincando desenvolvendo a psicomotricidade, considerando isso uma das grandes conquistas da equipe. A EMEI tem os Contos de Fada como norteadores da sua identidade; para o próximo ano, uma das metas é trabalhar uma linha pedagógica que contemple ainda mais a comunidade.

“A partir disso, vamos escolher uma linha pedagógica que reja a escola. Ficamos muito tempo sem coordenador pedagógico, mas agora a nossa realidade já é outra. A comunidade acima de tudo mostrou que gosta do quadro de professores, um grupo que tem um vínculo bom, comprometido, todo mundo trabalha e pega junto”, contam Diomara e Perla.

A questão afetiva, a troca de carinho com as crianças também são de extrema importância no trabalho desenvolvido pela equipe que a todo o momento é elogiada pelas gestoras. Diomara e Perla frisam que a equipe se sente pertencente à comunidade e isso faz toda a diferença no trabalho prestado. “A maioria do atual quadro entrou, sentiu-se acolhido e ficou. A gente atravessa a cidade e vem porque aqui nos sentimos bem, nos sentimos em casa, nos sentimos uma família”, comemora.

A conexão com a comunidade é tanta que ex-alunos da EMEI já trazem seus filhos para estudar ali nos primeiros anos. “A gente trabalha com eles com muito afeto, o afeto é essencial”, destacam lembrando que o grupo é muito bom, que novas pessoas devem chegar em 2019 e serão bem acolhidas e integradas no afeto que envolve a escola.

“Teremos bastante firmeza para continuar o trabalho que estamos fazendo, destacando a função pedagógica da escola e deixando de lado o assistencialismo, mas com as crianças não tem como não ser doce”, confessa Diomara.

 

É preciso avançar

“Muitas vezes, o que falta em sala de aula, na escola, não pode ser comprado com a verba do município porque o Tribunal de Contas aponta. Brinquedos, livros e outros materiais acabam faltando na escola. Mas também não é possível pedir para os pais. O que fazer nessa situação?”, indagam.

Dessa forma, as ações desenvolvidas pela escola, como festinhas, servem para arrecadação de dinheiro para adquirir materiais básicos em uma escola de educação infantil, como brinquedos. Destacam que, por ser de periferia, a característica da escola é praticamente a mesma das outras escolas da rede, mas é possível perceber muita diferença entre EI e EF, já que a EI tem suas especificidades.

Lamentam a limitação das formações oferecidas pela rede municipal e recordam que, quando mudou a administração, retrocedeu-se em algumas questões, como as formações. As professoras frisam que, em governos anteriores, as formações recebiam mais atenção e eram de grande qualidade, durando vários dias de discussão sobre uma mesma temática.

“A gente se ajuda na escola, a gente dá suporte uma pra outra, trabalhando na construção da identidade da escola. Somos um grupo bom como o que a gente tem aqui. Mas no que diz respeito à formação pedagógica no município, nos últimos anos, nós retroagimos”, aponta Rejane Silva Da Luz, na rede desde 2001.

A professora destaca que diversos professores da rede estavam entre o grupo de pessoas que criou a escola de educação infantil, quando a mesa saiu da Sencas e passou a pertencer à Secretaria Municipal de Educação; contudo, quando mudou a gestão, não se trabalhou mais isso.

Adriana Tortelli, professora da rede desde 2006, atua tanto na educação infantil quanto no ensino fundamental e alerta que, atualmente, existe um abismo de diferenças entre os dois níveis. Reitera que a EI passa por dificuldades que o fundamental dificilmente aponta passar, por exemplo, a comida racionada.

As professoras ressaltam que a preparação de um parecer para a EI exige o mesmo tempo que a de um parecer do fundamental. Ele é tão importante e exige tanto do profissional quanto o do EF. “A mesma formação que me exigem no quinto ano eu vou utilizar com meus alunos pequenos, só que isso precisa ser valorizado pela administração e também pela comunidade, que devem participar dos processos avaliativos”, diz a professora.

A professora cobra do Executivo maior atenção e respeito aos professores da educação infantil. “Por ser mais recreativo, trabalhar mais a criatividade, parece que o professor de EI não tem o significado de ‘professor’ como no fundamental. Aqui ainda temos que desmitificar a visão da tia. Somos profissionais, não precisa nem pagar a promoção se não quiserem, só queremos um pouco mais de respeito”, ironiza Adriana em tom quase de súplica.

Mesmo tendo evoluído tanto em estrutura física quanto pedagogicamente com o passar destes mais de 30 anos de história, a EMEI Francisco Biancini possui algumas demandas que precisam ser contempladas o quanto antes.

Os assistentes lembram que, para que a escola consiga realizar um almoço diferente, por exemplo, precisa contar com a ajuda que sai do bolso de cada um dos professores e funcionários, “cada um dá um pouquinho”. Lembram que o rancho enviado pela prefeitura no mês de dezembro se diferencia dos outros meses do ano, por vir em menor quantidade e exigir certo racionamento.

O tamanho da sala diante da quantidade de alunos também é uma demanda da EMEI, que ainda sofre com a falta de suporte técnico. “Diversas vezes, somos todos nós fazendo faxina, pintando parede, colocando o próprio carro à disposição da escola”, afirmam.

Por mais positiva que seja a participação da comunidade escolar nas demandas da EMEI, muitas delas poderiam ser resolvidas pela Prefeitura ou através de verbas federais. Os recursos apertados acabam deixando como única opção a união de professores e funcionários, com o ainda em construção apoio dos pais, para garantir uma educação e uma estrutura de qualidade.

A demora para o laudo emitido pelo Semae também foi apontada pelos docentes como algo a ser agilizado, uma vez que, com o laudo em mãos, é possível desenvolver o atendimento mais adequado para o aluno incluído. A falta de laudo também é um problema, já que limita o profissional e não possibilita que se desenvolva um bom atendimento ao aluno incluído.

A professora Adriana Tortelli recorda que as inclusões na rede municipal ainda precisam avançar muito para que possam cumprir, de fato, a sua proposta. Lembra que muitos alunos ficam por um longo período sem laudo e que o professor deve estar preparado para desempenhar com maestria seu papel docente.  “A lei garante que essa criança tenha uma vaga garantida, mas, ao mesmo tempo, ela deveria poder contar com uma rede de apoio. Que rede de apoio é essa que temos hoje?”, questiona.

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